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Homeschooling: entenda o que é e o que pode mudar com novo projeto de lei

A discussão sobre a adoção do homeschooling, ou educação domiciliar em português, tem ganhado cada vez mais espaço no debate das políticas educacionais. No Congresso, em Brasília; na Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo), e na Câmara Municipal de São Paulo, há projetos de lei para regulamentar a modalidade.

O assunto, no entanto, não é novo. O primeiro projeto relacionado ao homeschooling no Congresso foi apresentado em 2001. De lá para cá, mais dez propostas foram encaminhadas, mas nenhuma avançou. Em 2018, a situação mudou quando o STF (Supremo Tribunal Federal) não considerou a modalidade constitucional, mas disse que ela precisava ser regulamentada.

Bandeira do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) —foi incluída nas 35 prioridades de seu governo— o projeto de lei que regulamenta o homeschooling e corre em Brasília tem chances de ser votado na Câmara dos Deputados até o fim deste mês.

O que é o homeschooling? 

O homeschooling é uma modalidade de ensino em que famílias escolhem ensinar seus filhos fora da escola, ou seja, em suas casas. Há casos em que os responsáveis oferecem os conteúdos às crianças ou contratam professores particulares.

A deputada e relatora do projeto que foi apresentado neste semana na Câmara, Luísa Canziani (PTB-PR), diz que é importante diferenciar a educação domiciliar das atividades não presenciais, que têm ocorrido durante a pandemia do coronavírus por causa do fechamento das escolas, para evitar a disseminação do coronavírus.

O que muda com a regulamentação do homeschooling? 

Caso o projeto de lei seja aprovado na Câmara, no Senado e sancionado por Bolsonaro, sem mudanças na proposta apresentada pela deputada Luísa Canziani, há uma série de regras que devem ser cumpridas pelas famílias.

Hoje, por exemplo, as crianças que seguem esse modelo não precisam ter vínculo com a escola, mas, no texto da deputada, os responsáveis terão de matriculá-las. Os conteúdos oferecidos deverão ser alinhados à BNCC (Base Nacional Comum) e a proposta da deputada sugere que as famílias podem perder o direito da educação domiciliar caso descumpram as regras ou o estudante seja reprovado em dois anos consecutivos ou três não consecutivos.

Há um projeto de lei em São Paulo sobre o tema. O que ele diz? 

Na cidade de São Paulo, também há um projeto de lei que defende a regulamentação do tema. Ele é de autoria do vereador Gilberto Nascimento (PSC), que afirma que a regulamentação pode colaborar com as famílias de caminhoneiros, artistas circenses, atores ou de alunos que não podem frequentar a escola por causa de bullying ou quando são impedidos por motivos médicos. “Não estamos mudando a educação, mas incluindo”, disse.

O projeto já foi aprovado em primeira votação e ainda precisa passar por um segundo turno antes de seguir para veto ou sanção do prefeito, Ricardo Nunes (MDB).

Nascimento usa como exemplo o caso da estudante Elisa de Oliveira Flemer, de 17 anos, que foi proibida pela Justiça de cursar engenharia civil na Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo) por fazer homeschooling.

Caso o projeto seja aprovado em São Paulo, as famílias que optarem em promover aulas em casa terão de fazer a matrícula do estudante em alguma escola da Educação Básica. Outras regras devem ser cumpridas:

  • A presença será computada pelo comparecimento do estudante nas avaliações;
  • Falta injustificadas podem obrigar o aluno a fazer ensino presencial;
  • As aulas devem acompanhar também a grade curricular regular.

A proposta municipal, no entanto, pode não ter efeito frente ao texto que tramita na Câmara Federal.

Municípios e estados podem aprovar leis sobre o tema? 

A especialista em direito educacional Nina Ranieri, professora de Teoria do Estado da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), afirma que o município não tem competência para regulamentar o homeschooling por causa da Constituição Federal.

“Legislar sobre educação é dever do governo federal. Os estados, seguindo artigo 24, e o Distrito Federal têm competência. Então, a Câmara [Federal] vai legislar e os estados podem complementar, mas o município não”, explicou a professora.

A especialista afirma ainda que a modalidade é ilegal no país. “O STF [Supremo Tribunal Federal] não declarou constitucional. Ele disse que a Constituição não veta, mas se não houver uma lei nacional sobre o ensino domiciliar, ele não pode ser oferecido”, disse.

Caso seja o projeto seja aprovado e sancionado, a professora aponta que a lei pode ser anulada, judicializando ainda mais o tema.

Não tem fundamento legal, todos aqueles que estão no ensino domiciliar estão atuando de forma ilegal. Existe na Constituição a obrigação da matrícula, se a criança está matriculada e não comparece, ela é prejudicada. 

As escolas terão responsabilidades, caso o projeto seja aprovado? 

A proposta da deputada tem uma série de determinações que devem ser cumpridas pelas famílias junto às escolas, como o compartilhamento dos materiais, avaliação, eventos e entre outros. Em entrevista coletiva online aos jornalista ontem, a deputada explicou que as diretrizes sobre o papel da escola e se elas poderão cobrar as famílias serão feitas pelo CNE (Conselho Nacional de Educação).

“Esse processo de gestão e ação vai ser tutelado pelas diretrizes gerais do CNE. A escola vai fazer o monitoramento, validar esses planos pedagógicos [enviados pelas famílias]”, disse a deputada. Ela afirmou que reconhece os desafios das gestões escolares e que o “país deve oferecer as melhores condições” para essa nova demanda.

O que dizem os críticos ao homeschooling? 

A bancada do PT e do PSOL é contra o projeto que está na Câmara Municipal de São Paulo. “A escola cumpre um papel essencial. Não é só conteúdo, mas também tem um papel social”, aponta a vereadora Luana Alves (PSOL).

Os partidos alegam ainda que a regulamentação do homeschooling impede a socialização da criança, prejudica o contato dela com outras formas de ver o mundo e valorizar a diversidade. “É uma forma de restringir os estudos da criança. Então se ensina apenas aquilo que se acredita, criacionismo [teoria que o mundo foi criado por Deus], por exemplo”, indica a vereadora Juliana Cardoso (PT).

No Congresso, o tema também divide opiniões. Além das críticas já feitas, deputados contrários ao projeto afirmam que há outras prioridades na educação, como ações para mitigar os efeitos da pandemia.

E quem defende o ensino domicilar? 

Ao Aned (Associação Nacional de Educação Domiciliar) disse que reconhece a iniciativa da regulamentação, mas identificou “várias inconsistências e equívocos no texto” apresentado na Câmara. A associação, uma das principais no Brasil sobre o tema, afirmou que está em contato com parlamentares para propor melhorias.

Caso não haja mudanças, a Aned diz que irá se manifestar de maneira contrária a proposta, “pois pior que não ter uma lei é ter uma lei ruim que inviabilize a prática da educação domiciliar”.

Quais são os próximos passos no Congresso?

Até o fim desta semana, Canziani disse que se reunirá com as principais bancadas partidárias para ouvir possíveis sugestões ao texto e buscar apoio dos parlamentares. “Se a gente achar que é conveniente fazer alguma alteração, não tem problema nenhum. Se for para melhorar e zelar por essas crianças, tudo bem”, disse a deputada.

Por acordo no Congresso, o texto vai direto para o plenário, em regime de urgência. Se aprovado, vai para o Senado e depois para sanção ou veto de Bolsonaro.

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